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sábado, 15 de maio de 2010

Nem o coelhinho da Páscoa se salva

Nem o coelhinho da Páscoa se salva. As antigas barrinhas de chocolate de 220g emagreceram para 200g, depois 190g, 180g e, na semana passada, comprei uma de 170g! Ora, que o chocolate engorda eu sei, mas quem devia fazer regime era eu, não a barra, certo?

A velocidade da indústria do mal é muito maior do que a do bem. Proativa, a indústria do mal é um setor muito valorizado de empresas que possuem um departamento obscuro, em que pessoas vestidas de preto sacrificam pequenos animais domésticos e bebem o seu sangue num macabro ritual cujo objetivo é responder à pergunta: como maximizar o lucro dos acionistas?

O risco do descomprometimento com a ética nos negócios é o desenvolvimento de um olhar criativo para passar a perna nos seus clientes, concorrentes e quem mais estiver pela frente. Nem tudo que é legal é ético, já dizia um brilhante jurista dos tempos de negócios feitos no fio do bigode. Hoje, as empresas estão insuflando o ego de pessoas extremamente egoístas, competitivas e confortavelmente maquiavélicas, que encontram na falha dos concorrentes um motivo para justificar a própria torpeza e de alimentar uma concorrência desleal pelo cliente, o maior de todos os prejudicados.

Mas será que existe espaço para profissionais éticos nesse mar de tubarões? Existe. Há empresas comprometidas com valores éticos que sepulcrariam de antemão toda e qualquer medida que pudesse representar a burla do cliente como diferencial para o próprio crescimento. Em outras palavras: assim como há pessoas ávidas por crescer em suas empresas, capazes das mais criativas formas de exercer a arte de puxar o saco e os tapetes, há empresas dispostas a qualquer coisa para obter alguma vantagem.

O mero poder de compra do cliente brasileiro, que já passa a adotar uma postura de valorizar empresas que respeitam o meio ambiente através da compra desses produtos é uma forma de combate a esse tipo de prática desonesta que se tornou tão habitual a ponto de hoje já haver pessoas que entendam tal prática como algo normal, próprio do mercado competitivo e, pasmem, chegam a chamar isso de criatividade.

Não existe criatividade sem ética. E o poder de escolha do consumidor na compra não basta. É preciso haver agências governamentais eficientes, que penalizem com rigor estas práticas perniciosas, assim como as universidades devem insistir em formações que direcionem os futuros executivos a encontrar meios mais criativos de enfrentar a concorrência.

Certa vez assisti a uma partida de futebol em que a violência, por miopia do árbitro, correu solta para os dois lados. Uma lástima. Futebol nota zero. No intervalo, um técnico teve a iniciativa e a sabedoria de chamar o seu colega de longa data que dirigia, naquela noite, a equipe adversária. Esclareceu que o jogo continuasse violento daquele jeito, perderíamos atletas por contusão, o que seria uma lástima para ambos, porque o campeonato ainda estava no início. Selaram um acordo de ir, cada um ao seu vestiário e de ordenar ao time que haviam feito um pacto de lealdade de apenas cometer faltas realmente necessárias.

Em que pese o risco de interpretação de cada atleta numa orientação subjetiva dessas, a essência foi assimilada por todos e o jogo terminou num formidável 3 a 3, fruto de um jogo limpo, em que até os gandulas trocaram as camisas no final do jogo em sinal de congratulação.

Mas mercado não é futebol e cliente não é torcida, é consumidor. E, como a fiscalização é reativa, lenta e muitas vezes ineficiente, nos vemos compelidos a apelar para a ética de nossos executivos para que o quadro não se agrave ainda mais e, para a nossa esperança, há muitos exemplos brasileiros de profissionais que não aceitam negociar seus valores no jogo de vale tudo que alguns insistem em jogar. Seriedade, competência e respeito ao consumidor são valores que esperamos ver, um dia quem sabe, voltar a fazer parte das atitudes do senhor coelhinho da Páscoa. Ou podemos torcer que ele peça demissão e mande o seu curriculum para a indústria de tabacos ou de bebidas alcoólicas. Aliás, não seria o máximo que os cigarros passassem a ter cada vez menos nicotina e as bebidas, cada vez menos álcool em suas garrafinhas?

Fernando Botto é consultor de negócios, palestrante, docente e escritor. Autor dos livros Alho cebola e beijo na boca (2004) e Fungos da Mongólia (2010).

Um comentário:

Monique disse...

Sensacional esse artigo ... muito bem lembrado a diminuição da quantidade de chocolate nas barras e o preço mantido ou aumentado mesmo com a diminuição do produto ... enfim ... tema abordado em 2010 que continua se alastrando em 2012 ... e o consumidor óhhh patrocinando a própria burrice. Quem compra ovo de páscoa é burro ao quadrado e quem continua consumindo chocolate mesmo com a diminuição do produto e o aumento do preço ... é pior ainda !! Enquanto se consome, enquanto se aceita, enquanto a indústria fatura os preços continuam a subir, os produtos continuam a diminuir e a população continua se matando de trabalhar para acompanhar o aumento dos preços, esse comodismo, essa falta de iniciativa para usar o cérebro, o bom senso, alimenta um sistema canibalesco onde o predador continua vivo, porque sempre existe presa para dar continuidade ao processo de perpetuação do sistema. Todo mundo sabe que o leão é o rei da selva, o homem é o único predador, porém, quando eles tentam atacar um bando de animais e esses ao invés de recuar partem para cima, eles desistem ... bom se todos não comprassem mais chocolate, não abastecessem os carros, enfim ... bom se fossemos unidos para decidir de que forma o sistema deveria ser ... é engraçado, porque embora somos maioria, não há de fato coragem para determinar o que é correto para a maioria, então a minoria manda e obedece quem não dispõe de coragem! The end ...

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