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sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Negócios ambulantes são a nova febre de angola



Donos de pequenos negócios criam espaços e desenvolvem actividades lucrativas como meio de driblar a inflação imobiliária

Por Fernando Botto, publicado na Revista Figuras & Negócios, de Angola

Os “ambulantes” são os profissionais que sobrevivem de vendas de produtos de baixo valor em barracas que são instaladas temporariamente, prática típica de países em que os empregos formais são muito escassos. É claro que o surgimento, manutenção ou diminuição desse perfil de profissionais são influenciados por indicadores macroeconômicos que representam imponentes desafios para todo e qualquer governo.
Luanda atravessa um longo e tenebroso momento de inflação imobiliária, impulsionada por factores que nem os melhores economistas ou astrólogos de plantão conseguem explicar com exactidão. O custo de vida na capital, seja para nacionais ou para estrangeiros, é um dos mais altos do mundo e não se tem notícia de nenhum modelo econômico que explique o fenômeno da economia angolana, que é medalha de ouro em crescimento mundial e promete mais novidades nos preços de terrenos, apartamentos e vivendas nos próximos anos.
São muitas as variáveis que compõem o preço de um imóvel em Luanda: proximidade da Mutamba, cuja alcunha é “capital de Luanda”, andar alto ou baixo, estado de conservação do prédio, condições de água e do gerador, número de quartos e, é claro - quem pretende arrendar. O cliente ideal é o estrangeiro, de preferência que pertença a uma petrolífera disposta a desembolsar algo entre cinqüenta e cem mil dólares por dois anos de contracto de um apartamento de médio padrão com todos os predicativos de um imóvel que há mais de trinta anos não sabe o significado da palavra manutenção.
Com a procura crescente por imóveis e a incapacidade das construtoras em atender a essa demanda em tempo real, os preços tendem a subir e isso torna alguns negócios inviáveis, como é o caso de peixarias, constatado como ramo de actividade em crise, em decorrência das margens de lucro cada vez menores em função do custo para se arrendar um imóvel. Em pouco tempo, se calhar, será mais lucrativo encerrar o negócio de peixaria e “zungar” pela cidade. Difícil mesmo será desenvolver o talento das zungueiras que conseguem anunciar o seu produto com uma vitalidade vocal que daria inveja até ao saudoso tenor Luciano Pavarotti.
Mas, angolano que se preza não se deixa abater com a alta dos preços de imóveis e dá uma verdadeira aula de empreendedorismo e criatividade. Espalhados por Luanda e por muitas províncias estão pequenos empresários que incrementam os rendimentos familiares com negócios que se caracterizam pela sua mobilidade, os chamados “negócios ambulantes”. Paula José, 27 anos, há cinco anos retira seu “rollete” da garagem de sua casa na Cassenda para garantir um rendimento mensal bruto médio de setecentos dólares, obtidos do comércio de cachorro-quente, hambúrguer e bebidas diversas. A renda da empresária do “comércio ambulante” é um incremento do salário obtido como orientadora educacional. Os preços são de Kz200 por um saboroso cachorro-quente e Kz400 por um hambúrguer, que leva queijo, fiambre, ovo e salada. Segundo ela, “o meu sonho é de conseguir um emprego formal. Se eu ganhasse quinhentos dólares por mês e uma chance de crescer, deixaria tudo de lado.”
Outro empresário que soube contornar os altos preços dos imóveis é Francisco Mauete, de 26 primaveras. O jovem trabalha há dez anos com unhas e há quatro decidiu investir as economias acumuladas numa tenda. A espera dos clientes, homens e mulheres, é um dos frutos do investimento que fez. Mauete cobra entre mil e dois mil kwanzas para fazer as unhas e quinhentos pelos desenhos. Afirma o dono do negócio ambulante que “nos dias fracos ganho, no máximo 50 dólares, mas nos dias de movimento, chego a facturar até 150”. Indagado sobre o sonho da sua vida, Mauete não hesitou: “um dia terei o meu salão aqui no Cassenda”.
Mas não é apenas em Luanda que os negócios ambulantes fazem sucesso. Suzi, que vive no Calulo, na Província do Kwanza Sul, divide o seu tempo entre os dois sítios. Transporta a sua “empresa de cabelos” entre a sua encantadora cidade natal e Luanda. Nos dias de melhor movimento para aplicar cabelos, recebe cerca de dois mil kwanzas no Calulo e cinco mil em Luanda, mas adverte: “em Luanda ganha-se mais, mas gasta-se muito mais”.
Os negócios ambulantes são as soluções encontradas por empreendedores que não dispõem de recursos suficientes para arrendar um imóvel, mas buscaram recursos criativos para ganhar alguma renda extra que pode significar uma poupança para realizar um sonho, manter um padrão de vida, ou para a mera sobrevivência.
Possivelmente por representar uma possibilidade de realização de sonhos com baixo investimento inicial que o negócio ambulante se mostre tão interessante, mas vale dizer que o sucesso de qualquer empreendimento em Angola depende, além da atitude, do conhecimento do ramo e da qualidade do produto vendido ou do serviço prestado. Afinal, quando a febre da abertura de novos negócios ambulantes passar, restarão apenas aqueles que Charles Darwin chamaria de “melhores adaptados” ao imprevisível mercado angolano.

Fernando Botto é consultor de negócios em Angola: fernandokwz@gmail.com

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