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quinta-feira, 19 de maio de 2011

Desonestidade que virou normalidade

No marketing há uma tênue linha que separa a esperteza da desonestidade. E esta, revestida de uma atraente embalagem, passa a ser vista como uma interessante esperteza e, depois de pouco tempo, vira algo comum e normal.

As barras de chocolate são um bom exemplo disso. De 200 gramas, que eram o padrão de uma barra, passaram a 190 gramas, pelo mesmo preço. Pouquíssimos consumidores perceberam a redução, porque a embalagem permaneceu exatamente igual, à exceção do peso líquido, que reduziu 5%. A desonestidade virou regra e as barras de chocolate passaram a 180, 170, 160, 150, 140 e nesta semana encontrei uma impressionante barra de chocolate de ridículas 130 gramas! Desonestidade que virou normalidade.

Quem é que confere a metragem dos rolos de papel higiênico? Pois quem não costuma verificar isso é hora de conhecer esse outro tipo de desonestidade que virou normalidade. Algumas fábricas reduziram de 60 para 50, depois 40 e agora, encontra-se rolos de 30 metros. Daí vem o golpe complementar: pacotes de pague dez, leve onze rolos. Desonestidade que virou normalidade.

Uma grande rede de fast food internacional lançou no Brasil uma campanha neste mês de maio, com preços promocionais idênticos de vários produtos diferentes. Colocou o nome de um deles, SUNDAE, em destaque. Junto do nome, a foto do produto, igualmente em destaque. Embaixo, quase impossível de se ler, bem espremidinho, está escrito "caramelo". Ou seja, se você pedir um sundae de chocolate, paga mais caro. O mais barato é apenas o de caramelo. Desonestidade que virou normalidade.

Comprar um carro do ano é uma outra coisa pra lá de estranha. Como é possível comprar um carro 2012 em 2011? Ah, é só o modelo... Absurdo! E a desonestidade está ainda mais ousada. Há fábricas que entenderam direitinho o golpe e lançaram, em 2011 o modelo 2013. Desonestidade que virou normalidade.

Em meio a uma avalanche de criatividade desonesta, os órgãos de defesa do consumidor encontram um enorme desafio de coibir um defeito moral que reflete a ausência de uma política pública educacional voltada para a formação de profissionais comprometidos com a ética e com a construção da cidadania. Enquanto houver educadores que confundem criatividade com desonestidade e consumidores que não fazem escolhas pelos fornecedores éticos e que se preocupam com a sustentabilidade e com um mundo melhor, estaremos condenados a viver num país em que a desonestidade é prima-irmã da normalidade.

Fernando Botto é escritor.

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